segunda-feira, 30 de abril de 2018

O dia em que não me esqueci de ti

Havia passado pouco mais de um mês desde a última vez que te vira. Desde então, tudo parecia organizado. O sentimento avassalador, terminado e arrumado na velha caixa de quinquilharias, guardada na esquina poeirenta do sótão. Tu em mim, já tinha conseguido um fim. Tu eras passado. Eras passado há muito tempo. Eras pretérito imperfeito. Pensei que te tinha aperfeiçoado. Estava enganada.

Aqueles, que como tu, estão presentes na nossa vida há tanto tempo, marcaram tão boas memórias, deram-nos incontáveis sorrisos, preencheram o nosso peito de tão gigantesca felicidade... são difíceis de não recordar.

Ao fim de tantos anos, descobri muito acerca de nós. Descobri que fui aprendendo a amar-te dia após dia, um momento atrás do outro. Acho que só percebi isso tarde de mais.

Tínhamos tantos ventos e marés contra os quais tínhamos de remar... Tinha tanto medo. Tenho tanto medo.

Sempre tive uma obsessão por certezas, por isso demorei tanto tempo a ter a certeza de que o mais certo eras tu e eu, éramos nós. Acho que a certeza só emergiu no momento em que soube que te perdi, perdi-te para o mundo. Ficar sem ti, foi ficar sem rumo, continuando a acreditar que estava no caminho certo.

Ergui a cabeça e decidi que o mundo continuaria a girar, mas ele jamais voltou a girar da mesma forma. Acreditei que me habituaria, mas não me habituei.

Então parei. Fechei-me dentro de mim, reflecti e meditei. Conclui que precisava de te ter. Desta vez tentei. E falhei. Mas não desisti. No meu íntimo sabia que havia de te ver em breve, e vi. Há pouco mais de um mês.

Era um dia soalheiro e todos pareciam felizes. Alguém soltara borboletas dentro de mim semanas antes do hoje. Esperei ansiosamente e preparei-me para o momento em que te voltaria a ver, depois de infindáveis tempos.

Quando lá cheguei, não te vi. Temi desmoronar-me, partir-me em mil pedacinhos e desaparecer com o vento. Inspirei e expirei lentamente. Estava determinada a chegar até ti.

Entrei, e o espaço estava repleto de gente. Assim que a música começou, cada molécula do meu corpo vibrou. Soube que estavas ali.

E do nada vi-te. Naquele momento, o espaço estreitou-se, as pessoas dissiparam-se. Éramos só nós. Estáticos, cada um no seu canto. Naquele momento, em que os meus olhos se prenderam nos teus, tive a certeza que eles também me procuravam.

E do nada surge aquela música, aquela maldita música. A que contava a nossa história, ou pelo menos a minha versão da história. E fui obrigada a cair na realidade. Os ecos que murmuravam os rumores de haver outra, atingiram-me que nem flechas. Mas a verdade é que te procurava, gritando o teu nome aos ventos. "Eu sem ti, tu sem mim, como poderíamos ser felizes???" Maldita música.

Naquele dia, estava determinada a dar um rumo à nossa história. Qualquer rumo.

Não conseguindo controlar a minha capacidade inata de estragar tudo aquilo com o que me importo, acabei por boicotar a mais remota possibilidade de um final feliz.

O único rumo remanescente era o que já tentara outrora, continuar com a minha vida. Sem ti.

E pouco mais de um mês depois, eu acordo como que em outra vida. Desço a pés descalços, os degraus de pedra fria. Preparo o pequeno-almoço. Sento-me à mesa e ligo a televisão. Aquela música, aquela maldita música!!! E tudo que ficara no passado aterrisa subitamente no meu presente. "Eu sem ti, tu sem mim, como poderemos ser felizes???"


Ontem à noite custou-me a adormecer, porque ontem foi o dia em que não me consegui esquecer de ti.














Que os sonhadores nunca deixem de sonhar...