Esquece-mo-nos de aproveitar aquele gratuito pôr-do-sol, em detrimento do preenchimento daquela papelada enfadonha que nos acossou até casa.
Esquece-mo-nos do sabor daquela limonada,
Esquece-mo-nos da sensação daquele abraço apertado no final do dia,
Esquece-mo-nos do frescor da brisa marítima,
Esquece-mo-nos do gélido chão de mármore,
Esquece-mo-nos do calor da lareira de Inverno.
Esquece-mo-nos de parar. Esquece-mo-nos de viver a vida enquanto é nossa. Enquanto ainda temos tempo de vive-la.
Somos soberbos, achamos que nunca há um amanhã.
Corremos fugazmente por entre os corredores da vida.
Desatentamos aos pormenores.
Esquece-mo-nos de amar.
Dá-mos importância a quem não importa, ao que não importa.
Esquece-mos a inquestionável importância dos importantes.
Mas um dia há, em que tudo finda, e a nossa mera existência não é excepção, mas antes a regra...
Um dia tu não vais estar mais aqui...
Um dia eu não vou estar mais aqui...
Mas tudo continuará da mesma forma.
A pequenez humana marca a diferença enquanto é o receptáculo da vida e com ela molda o mundo, quando este se esvazia, o seu valor parece esvair-se com ele
Quando não estiver mais aqui, a Terra continuará a girar
Quando não estiver mais aqui, os pássaros continuarão a cantar
Quando não estiver mais aqui, as estrelas estarão lá no céu
Quando não estiver mais aqui, o dia e a noite continuarão sincronizados
Quando não estiver mais aqui, rios continuarão a correr para os oceanos
Quando não estiver mais aqui, o sol continuará a brilhar
Quando não estiver mais aqui, as flores continuarão a florir
Quando não estiver mais aqui, as crianças continuarão a correr
Quando não estiver mais aqui, as varinas continuarão a pregar
Quando não estiver mais aqui, o resto do mundo continuará a correr freneticamente
Quando não estiver mais aqui, quando não estiver mais aqui...
Quando não estiver mais aqui, tudo continuará como está, menos eu. E eu sendo apenas eu, não marcarei essa indubitável diferença que todos almejamos suscitar, esse clamor da espécie humana, essa vontade de que sintam a nossa falta, quando não estivermos mais aqui. Alguns sentirão, mas a efemeridade da vida é transcendente, propagando-se para as esferas da existência.
Um dia, os que cá ficam olharão para o passado e se espreitarem bem, lá nos encontrarão, sentados num banco de jardim a rir sem razão, a beber uma bica e a contemplar a intemporalidade
do momento finito.
Que os sonhadores nunca deixem de sonhar...
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