quarta-feira, 29 de abril de 2015

O tempo

O tempo.

Ele não pára nem por um segundo, porque um segundo é tempo.
Estranhamente, ele passa, mas nem sempre o vemos passar.
Deve ser das poucas coisas que não vemos passar. Ou a única.

Deixei os anos passar por mim sem os contar, sem os ver, sem os sentir.
Fiquei imóvel e empedrada.
Estagnada.

Encolhi-me num canto, num simples recanto da vida, à espera de permanecer intocada.
Quase consegui.
Até porque parei de sentir o tempo.

Parei no tempo.

Mas o tempo não parou em mim.


Ele correu, como um riacho corre rumo ao seu destino.
Se é que tempo tem destino.
Mas seguiu o seu caminho.
Se é que tempo tem caminho.
Ou rumo. Ou o que seja. Até porque uma coisa é certa: ele não pára.

Soltei-lhe as rédeas e ele lá foi.
Trouxe umas coisas, mas cobrou por elas. Ou eu deixei-o cobrar.
Trouxe mas levou.
E trará novamente, se assim for o seu percurso. Se assim o quiser, se assim o desejar.
Ele manda. Ele é intemporal.

Mas o mais estranho, é como tudo parece não passar de um sonho (ou pesadelo) quando paramos, para não parar no tempo.
Quando paramos o que sempre fizemos correr.
Quando paramos para sentir.
Quando paramos para ver. O tempo.

E o que se lhe apega. Ao tempo.

E não sei. Ou sei. Mas gostaria de não saber.

Vem aquele apertosinho em pésinhos de lã, que mexe e remexe no nosso peito.
Não arranca pedaços, nem pedacinhos, mas é quase como se os deixa-se soltos.
Descompacta-nos por dentro.
Deixa-nos sentir.
Obriga-nos a sentir.
Até o que não queremos.
Principalmente o que não queremos...

Vem também um nó na garganta e um brilho cortante no olhar.
O nó não é grande, mas está lá.
O brilho cortante no olhar, não arranca lágrimas, mas tem o poder de arrancar.


O tempo arrasta a saudade.
Ás vezes acho que são o mesmo.
Será que são sinónimos? Talvez... numa outra dimensão.

Outras vezes, mais do que saudade traz a consciência.
A consciência, a sensação de dormência prolongada, e a consequência de tudo o que queríamos e que deixamos escapar por entre os dedos.
E mais uma vez, os nós, os brilhos cortantes, e os desprendimentos lá para o meio do peito.


Acho que o tempo, quando nos consciencializamos da sua passagem, traz SAUDADE do que tivemos, do que não tivemos, do que poderíamos ter. Do que fizemos, do que não fizemos, do que poderíamos fazer.


Acho que se pode resumir a isto:



"Sinto longe o passado, sinto perto a saudade."
(Pessoa)








Que os sonhadores nunca deixem de sonhar...

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